Afinal, o que o bebê perde quando nasce?

Perde o corpo da mãe.
Você já tinha ouvido a expressão "desmame do corpo da mãe" em algum lugar?

Acho difícil, porque simplesmente essa ideia tão óbvia e simples não é nem comentada em nossa cultura e muito menos levada em conta.

 

O que o corpo da mãe fornece à criança que ela perde abruptamente ao nascer?.

Um: ela perde o tato, pois está em permanente contato com a parte interna do útero, lubrificada pelo líquido amniótico, sendo continuamente acariciada porque os movimentos do corpo da mãe produzem um deslocamento sentido sobre o corpo como carícia. Então, podemos dizer que o corpo da mãe é uma máquina de fazer carinho. É isso que o bebê perde.

Dois: perde o calor, 36 graus sem variação. O corpo da mãe é um aquecedor de primeira qualidade. As roupas que envolvem o recém-nascido não exalam calor para mantê-lo aquecido, coisa que até então era a sua realidade. Cadê o calor? Virou frio.

Três: perde o som ininterrupto do coração da mãe batendo. Quando nasce, os ouvidinhos do recém-nato ficam como que num vácuo, sem a presença daquele som que era parte integrante de todos os seus momentos de vida. Simplesmente sumiu. Cadê aquele som? Cadê aquela presença sonora sem a qual aquele serzinho nunca viveu? Sumiu.

Quatro: perde os movimentos do corpo da mãe. A mãe funcionava como um carro que carrega no seu interior os passageiros. O pequeno ser dentro da barriga da mãe assemelha-se muito a um passageiro sendo carregado na "barriga" do carro. É por isso que quem tem filho sabe muito bem: o bebê adormece rapidamente quando colocado dentro de um carro. É costume em muitas famílias sair para "dar uma voltinha de carro" para o bebê se acalmar e dormir. É... e funciona mesmo porque isso o leva de volta a um território conhecido, mas que ele só volta a ter de vez em quando.

Cinco: perde a intensidade com a qual ouve a voz da mãe. Sim, porque uma criança no berço ouve muito menos frequentemente a voz tão conhecida da mãe. Aquele que fica junto do corpo materno a ouve o tempo todo. Até mesmo quando dorme, tranquila, carregada pra lá e prá cá na mãe-canguru.

O bebê perde, então, tudo isso. Perde quase tudo o que tinha. O que poderia ser feito para que todas essas perdas não ocorressem de forma tão radical e violenta?

Luciene Godoy - Psicanalista